O
SENTIDO DO OLHAR
“Setas
indicando caminhos errados
chegar
só é possível de olhos vendados”
Viajar em um carro pequeno com cinco pessoas (muito amadas)
passando por três países foi um dos momentos inesquecíveis de minha vida. Há muito
o que se dizer dessa viagem. Só que agora vou bater uma bolinha bem rasteira e dar
passes curtos. Desses que cabeças de área sem muita criatividade dão praticamente
o tempo todo, pois só quero falar sobre setas ultrapassagens e sinais na
estrada.
Para começo de conversa, ainda no sul do Brasil, me vi aprisionado
em uma ponte estreita sendo forçado a dirigir de marcha ré por mais de 500m. O
que pode ser algo fácil para você que sabe muito bem o que faz com um volante
na mão. Para mim, foi um tremendo desafio. Suor frio escorrendo no rosto, o
temor de um acidente, o olhar grudado no retrovisor, a impaciência dos outros
motoristas que vinham em sentido contrário. Enfim, um show de horrores que só
poderia ser explicado pelo Capital Inicial. Tudo isso causado por um par de bonitões
cujo único dever era levantar alternadamente placas de pare ou siga.
Já em solo portenho passamos a sofrer com setas voltadas
para esquerda por diversos caminhoneiros justo quando a ultrapassagem parecia
ser segura. Quando eu e o Francisco comentamos sobre isso com o Miguel ele nos
explicou que passou pela mesma situação quando dirigiu no Brasil, até entender
que os caminhoneiros brasileiros e argentinos usam sinalizações inversas para dizer
se você pode ultrapassar ou não.
Se isso tudo lhe traz ensinamentos metafóricos, imagina o drama
de um brasileiro que tem que dirigir em Londres?
Eu bem que poderia estar preparado para tudo isso se
ouvisse o meu pai.
Em
um desses momentos raros em que ele era capaz de combinar uma faceta de sua
personalidade, a de Dr. Jekyll, com uma bela pitada de bom humor o cara tinha
tiradas sensacionais. Pena que o humor dele era muito mais comum quando ele
tomava umas pingas e virava Mr. Hyde.
Eu
estava brincando do outro lado da rua quando ele me chamou, olhei para a
direita e para esquerda antes de atravessar e receber um abraço. Logo após ele
me disse: Remo, não basta olhar para os dois lados para saber se algum carro está
vindo, olhe para baixo à procura de submarinos, para trás para não ser
apunhalado, mas principalmente mantenha seus olhos nos aviões do céu e para
frente para planejar o futuro.
Aqui
chega a hora de discordar da bela música que serve de alerta. Não se trata de
fechar os olhos, mas saber em que confiar. Se algo buzina alto em seu bom senso
a despeito do que lhe dizem é a hora certa de entender se você deve parar,
virar para um lado ou para ou outro ou mesmo acelerar, diante de uma decisão consciente.
Mas isso depende da sua capacidade de não chocar ovos de cuco e realmente veja
o que está fazendo.
Mesmo assim fui atropelado por um fusca alguns meses depois.
Pelo que me parece não sou o único que
poderia ter aprendido um pouco mais com lições tão óbvias.