Acabei de escrever uma homenagem às mães de minha
vida. E o que deveria ser leve e bem humorado, findou sendo um texto denso com
duas referências a mitologia grega.
Juro não ter sido minha intenção. O escrito fugiu de
minhas mãos. Não se trata de usar aqueles recursos pseudointelectuais para
terminar discussões. Do tipo: “isto é só um paradoxo de fluxo temporal”. As deusas
gregas invadiram minhas linhas, pois elas falam muito em o que é ser mãe.
A primeira referência é de fácil explicação: Afrodite
e Psiquê simplesmente reencenam a eterna rivalidade entre sogra (não tem jeito,
quem é mãe corre este risco) e nora.
Já o que ocorre entre Demeter e Perséfone leva a nossa
conversa para outro nível. Espero que vocês me permitam tanto contar quanto
interpretar, me apossando indevidamente das duas vertentes.
Lá vou eu.
Para saber quando o sagrado feminino deixou de ser cultuado é preciso entender o porquê das deusas terem sido substituídas violentamente por seus
pares masculinos. A mitologia reflete o mundo, e do lado de cá os homens tomavam
o poder, que era antes direcionado a elas, especialmente nas sociedades agrícolas.
O que tem toda lógica, uma vez que só uma mulher pode florescer e frutificar.
Cada uma das deusas teve que lidar com um par mais
poderoso e menos compassivo.
Neste contexto Demeter era a mãe terra. Só que ela deu
o azar chamar a atenção de um dos três deuses mais poderosos, Posseidon (o pai
de Percy Jackson, lembra?). Ao fugir ela se transformou em águia, gazela, leoa,
pomba e ia conseguindo (o macete seria buscar algo que não se encontrasse no mar), porém, quando virou égua (já ouviu falar em cavalo marinho?) foi violada pelo deus
dos mares.
Entretanto, nada a lamentar. A deusa que era mãe de
todos passou ter uma filha só dela: Perséfone. Contudo, esta também chamou atenção
de um deus, o do submundo. Hades a raptou. A refém, distraída, se sentou à sua
mesa e de modo incauto aceitou uma romã.
Feito. O feitiço inquebrantável a prenderia
eternamente.
A mãe procurou em cada canto. Quando finalmente soube
da sina da menina, pediu a arbitragem de Zeus, que nada pode fazer diante de regras
fixas.
- Sou a mãe terra. Devolvam minha filha. Ou nada vai
florescer ou procriar.
Quando todos estavam famintos, os três grandes deuses
chegaram a um acordo.
Perséfone ficaria parte do tempo sob e outro sobre a
terra.
Ela é o grão de trigo.
A história acaba aqui.
Mas há algo ainda a dizer: os três maiores poderes
nada podem contra a determinação de uma mãe.