domingo, 18 de julho de 2021

Torcedor

A palavra vem de torcer que é o que as jovens faziam com seus lenços brancos, cujo propósito original seria acenar para os seus jogadores prediletos. Então a pergunta: “por quem você torce” se tornou o modo oficial de entender uma paixão incompreensível.

Aí alguém lá longe no campo chuta um objeto esférico, que teima em quicar e rolar (aquele que chamo de Vossa Excelência), e este toca as redes de um modo peculiar, é a pesca de um enorme atum.

Delírio.

Orgasmo coletivo por procuração.

Você não chutou nada. Não cabeceou nada. Não treinou a semana inteira. Não entrou em campo com um tornozelo que mais parecia o pilar do World Trade Center. Não tomou cotovelada do zagueiro de dois metros e noventa. Não tomou um cartão amarelo porque reclamou. Não sentiu seu pulmão quase explodir na corrida. Não deu um biquinho no momento certo.

Seja como for você grita!

E também o narrador que vai dizer: “lindo, lindo, lindo”, ou “ripa na chulipa”, ou ainda (meu preferido) “olha lá, olha lá, no placar!”.

E também o empresário que trouxe um cara lá da Itália para ver o seu atleta.

E ainda o dirigente que via as chances de reeleição minguando.

E o patrocinador que vai ver sua marca em destaque.

E o político que vai usar a camisa do time na próxima live.

Não importa: você vai abraçar o  cara ao lado, um maluco que você nunca viu antes e pular que nem pipoca.

Esse gol é seu.

sábado, 17 de julho de 2021

Meu querido filho

Dentre diversas coisas pelas quais passamos uma delas, que não me esqueço, foi o fato de que tive o privilégio de ser professor.

Naquela época eu brincava contigo e dizia que era ótimo ter um aluno no qual eu podia dar uns cascudos sem que o pai reclamasse. Então, a frase “poooorrrr faaaavooooorrrr Francisco!” Ficou famosa no Colégio Rogelma.  

Sei que no todo valeu muito a pena, superando a máxima de que dois bicudos não se beijam; uma vez que personalidade marcante, senso de justiça próprio e teimosia parecem ser atávicos.

Com o passar do tempo tive a chance de lhe explicar que a soma dos quadrados dos catetos equivale ao quadrado da hipotenusa, e aprendi que eu sou um geômetra que formou um algebrista. Também lhe ensinei que a Terra é Geoide, para somente com a série atual da franquia Star Trek você finalmente entender que devemos ir aonde nenhum homem jamais esteve. Passei muito tempo lhe doutrinando para finalmente nos encontrarmos na mesma torcida, mas ainda cabe a você aprender sozinho a lidar com as próprias derrotas. E recentemente tenho lhe ensinado que as palavras o vento leva, só que as suas colocações me mostram que hoje você tem muito mais clareza de como lidar com seus desafios profissionais do que eu jamais pude.

Também aprendi. Aprendi muito. Entretanto, vamos combinar que hoje não estamos aqui para falar de mim.

Hoje quero lhe ensinar a última lição antes de você se transforme em um trintão, e como é uma lição difícil você vai ter um ano inteiro para ruminar a simples ideia que vou lhe passar: Você bem sabe que em inglês você não vai ter 29 anos, você vai to be 29. Eis aqui meu segredo: os ingleses foram muito mais sábios... os anos não lhe pertencem, no máximo você pode ESTAR por ali em um breve momento.

Então: Viva!  Curta! Aprenda! Siga adiante!

Esse momento também vai passar.

Quanto a pertencer, saiba que pouquíssimas coisas são suas. E uma delas é o meu coração.