A TV era disputada a tapa lá em casa, coisas de família
com onze filhos, então me acostumei a ter meus desenhos preferidos...
preteridos. Só que tudo mudou quando conheci o Mr. Spock, aprendi a dizer que nunca
havia visto aquele episódio de um modo tão convincente que até eu acreditava,
então tinha que recitar baixinho: “Espaço a fronteira final, essas são as
viagens da nave interestelar...” A ficção já fazia parte de mim com os livros do
Asimov que vinham quase enfileirados da biblioteca pública para as minhas mãos.
Dentre as coisas que me fascinavam estava a porta que
abria automaticamente, a viagem em dobra espacial e o computador que respondia ao
comando de voz. Não chego a ser do tipo capaz de usar fantasias em convenções, mas
assumo que faço o sinal vulcano para desejar prosperidade ou mesmo para saudar
a porta do shopping que abre automaticamente.
Se você tem mais de 50, sabe bem do que estou falando,
e nem precisa ter visto Star Trek, que ainda é de certa forma de um nicho, porém
posso quase afirmar que não teve como escapar dos Jetsons.
Mesmo assim me considero muito analógico, comparado as
gerações definidas por letras de qualquer alfabeto, além do mais o inevitável conhecimento
da física (consequência inescapável de ser um nerd que se preze), deixa muito claras
as limitações da velocidade dos corpos estabelecida pela relatividade geral.
Tais limitações levam ao campo da fantasia imaginar o
uso de uma frase do tipo: “Computador calcule o tempo de deslocamento ao
planeta Oxx em dobra 9”. Talvez por isso minha longa resistência em adquirir
uma Alexa só para pedir músicas ou saber as horas. Mesmo assim ela finalmente
chegou lá em casa.
Até achei legal a conectar aos filmes que passamos
ver, e ouvir a rádio JB ou ainda um bocado de Beatles. Só que hoje finalmente
fomos surpreendidos por uma pequena magia. A Aninha (aquela garota que adotou o
nerd sem jeito há quase quatro décadas - me tirando da solidão do típica de
quem usava a mão direita para fazer carinho na esquerda para fantasiar que estava
namorando). Bradou retumbantemente: “Alexa, conte uma história”, ao que foi
respondida: “Você deve pedir permissão de seus pais para isso”. Depois de
massagear a bochecha de tanto rir, finalmente eu falei que iria resolver no
aplicativo, não seria a primeira vez que pensaram que ela era minha filha.
Bug resolvido e logo veio a história de um cachorrinho
esquisito de pernas longas, focinho achatado e rabo de pompom. Falante ele diz
para a menina que o achou que é assim por ser filho de galgo, neto de boxer e
bisneto de poodle, mas se o adotar será todo feito de amor.
Então o equipamento ultra tecnológico já se pagou,
simplesmente por um ato mais que humano de transformar em metáfora a minha própria
história vira-latas adotado por uma linda menina.