A CORAGEM DE ESCREVER
“Canto por que o instante existe
E minha vida está completa
Não sou alegre nem triste
Sou poeta”
Cecília Meireles
Todo mundo morre de medo de se expor, uma forma
de representar isto é sonhar que estamos pelados diante de uma multidão. O que
dizer então de pessoas que têm a coragem de escrever em jornais ou revistas?
Confesso que não dei a mínima para esta idéia quando
comecei a frequentar esta coluna (estava escrevendo para um jornal de Carmo
quando fiz este texto). Caso tivesse pensado com calma não estaria cozinhando
este texto para o Inter Região agora mesmo. Eu não teria entregado um texto
sequer para o editor, um amigo que admiro muito, nem andaria na rua apavorado
com a perspectiva de ter magoado alguém sem sequer saber o porquê. Não leria o
texto depois de publicado para ver repetições inadequadas ou atropelos à língua
pátria.
O problema é que quando escrevemos crônicas
expomos a nossa nudez mais extrema (vi isto em um livro chamado redação inquieta, que recomendo a todo
pré-vestibulando): ao escrever desta forma expomos a alma, o que nem sempre é
algo bonito de se ver.
Ainda bem que ninguém menos do que Fernando
Pessoa perguntou se só ele é capaz de tal vileza... Então se você, assim como
eu, morre de medo de ver o que escreve ser publicado, saiba que está em ótima
companhia.
Ontem meu editor me falou que precisava de mais
textos, e meu pavor se multiplicou em níveis estratosféricos: como fazer textos
dignos de publicação e ainda por cima sob tamanha pressão? E ainda (viu só,
usei esta expressão na linha de cima!) sob os olhares atentos de várias pessoas
que poderiam se divertir com uma gafe qualquer.
Isto não é simplesmente como cair de bicicleta
em uma rua movimentada, a perenidade da palavra escrita torna o erro em uma
exibição em horário nobre, sabendo que alguém pode estar gravando tudo para
futuras gargalhadas.
Então porque fazemos isto? Se a resposta fosse
a simples terapia bastaria guardar os escritos em uma gaveta que o efeito seria
(quase) o mesmo.
Mas outro texto me deu a resposta quando um
poeta admitiu que tudo que fez na vida não ultrapassou os próprios passos (o
que era uma mentira deslavada).
Não queremos isto! Queremos o risco, o fio da
navalha, o incomodo, a inquietação. E no final das contas, quem sabe alguém que
escreve melhor também não toma coragem de imprimir os seus fantasmas para
compartilhar conosco.