domingo, 27 de junho de 2021

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 Não sou um remo que rema

Sou um remo que rima

As palavras que não me pertencem

Assim que comunico a ação


A meta é a metáfora

O pulmão da mente

Quando entra é inspiração

Quando sai é ex...piração


Exausto me posto

E venho a público pelo avesso

Trago a alma para a rua

Nua, crua e finalmente sua.

Ódio

Um dia vi um lobo falando bem dele dizendo basicamente que ele era um líder que falava o que pensava.

Não esqueço do alerta da Lupina: há lobos que se vestem com a pele de cordeiro, mas também há lobos que se vestem com pele de lobo.

Enfim, é preciso mais que intuição para avaliar o lobo que chega. Cansei de ver lobos velhos se enganarem sobre o caráter dos outros como se fossem filhotes.

Alguns sinais são óbvios:

- Se não trata uma loba como a encarnação da Grande Loba.

- Se valoriza demais a matéria.

- Se perde o controle com facilidade.

- Se tem todas as respostas sobre o que é sagrado, mas desconsidera qualquer visão diferente.

- Se cansa falar de sua própria integridade, mas de um jeito ou outro acaba tirando vantagens.

Ou ainda:

- Se um lobo fica o tempo todo lembrando quem ele é, provavelmente ele mesmo não sabe.

Mas principalmente:

- se traz a fagulha do ódio nos olhos.

Outros detalhes são mais sutis, e se resumem em uma intuição diáfana e um cheiro podre que não conseguimos definir muito bem.

Assim foi a chegada do Rasteiro.

Eu imaginava que ele não conseguiria enganar a ninguém. Tão direto era o seu ódio e a maneira com a qual ele sempre desprezou as seguidoras da Grande Loba. Sei que já disse isso antes: não há nada de errado em seguir o Grande Cão, mas há muito de desprezível naqueles que não respeitam a centelha do sagrado nos outros.

E assim ele trouxe a semente do ódio, travestida em culto ao Grande Cão.

O ódio se espalhou por todas as terras.

Mas de tudo o que mais lamento foi a corrupção chegar aos corações dos inocentes e dos simples.

Cães e o lobos que antes amávamos hoje rosnam quando passamos. E se não tem motivos para nos odiar, inventam. Eles não têm muito a ganhar com isso. Mal sabem que o ódio é filho da ganância. É um ferrão que fere a quem atinge, mas também mata a abelha.

terça-feira, 22 de junho de 2021

Totó

Um dia eu estava morto de fome.

Não tinha opção, ou me aproximava da fogueira para comer restos ou não conseguiria dar mais um passo.

Ao invés da agressão recebi uns tapinhas na cabeça e mais comida do que eu tive em um mês.

Dizem que ele não conhece cheiros e não sabe uivar e que o cheiro dele lembra uma galinha molhada.

Só que de um jeito estranho sei exatamente o que ele quer dizer.

Várias noites passaram.

Logo entendi qual deveria ser meu trabalho: proteger meu humano toda vez que ele fosse dormir.

Espanto qualquer um que possa pôr em risco sua vida terrena ou espiritual.

Com o tempo fui me deitando cada vez mais perto.

Mesmo que ele faça algumas coisas estranhas, como me mostrar os dentes, é claro que sei que ele me ama. Sinto o cheiro de ocitocina cada vez que ele uiva de um modo estranho com um som que parece Thothou.

Em um dia frio ele me abraçou a noite toda.

Se isso não é amor, não sei o que é.

Sei que você deve achar estranho, mas digo sem nenhum medo de errar, até poque a Grande Loba tem formas estranhas de se manifestar: aquele humano é meu filhote.