Obviamente vou falar sobre personagens fictícios. Queria muito que não houvesse pessoas assim. O problema é que a vida teima em copiar a arte, mesmo assim sonho por um dia em que esta ficção jamais ultrapasse meus medos e minha pobre literatura.
O fato é que o Velho odiava ver crianças pisoteando o
pasto, o problema é que havia um córrego, nos córregos rãs são gratuitas e o
banho é livre, impensável para quem pagou duzentos contos de reis para ter
exclusividade daquele pedaço de terra.
Arranha gato. A planta é tão espinhosa que nem os
felinos, tão pequeninos se arriscavam em passar.
Paz. Paraíso particular. Pois assim devem ser os paraísos.
Quem poderia imaginar que seu deus único pudesse abrir espaço para povos idólatras e pagãos. Ele tinha a chave do tempo e quem não rezasse na mesma cartilha
deveria ter o destino das chamas ou pelo menos um frio glacial, nas penas eternas guardadas para os infiéis.
Pais ricos. Filhos nobres. Netos pobres.
A tradição era importante. O neto do Velho não herdou
as mesmas riquezas, mas eles vivam em um lugar de faz de conta, impensável na
realidade. Um reino distante onde propriedade tem valor, trabalho não. Logico que em um lugar assim o que é herdado não pode pagar imposto. Só assim ele
ainda podia comer ovo e arrotar caviar. Bradando a cada vez que bebia a mesma aguardente
dos escravos que preenchiam as velhas garrafas de whisky coisas como “quem
manda nesta piiiiiiiii sou eu”.
A última queimada, forma muito mais barata de manejar
o pasto, destruiu a cerca centenária.
A solução barata veio em forma de voltas e voltagem. Uma
cerca que ainda afastava os moleques em busca de rãs e diversão gratuita.
Pais ricos, filhos nobres, netos pobres, bisnetos eletrocutados.
O pior de tudo foi ter que ouvir a música predileta do
menino em sua despedida “toda gente cabe lá...”
Lá aonde? Em Shangri-La que não é!