Em homenagem Isaac Asimov que contaria
essa mesma história com muito mais precisão, simplicidade e beleza.
É
maravilhoso reler os grandes mestres, o problema é perceber o quanto escrevemos
mal comparados a eles. Por exemplo, acabei de me deliciar com um pouquinho do
Asimov ontem à noite. Justo quando tinha um texto prontinho para contar para
vocês. Então o velho russo me visita em sonhos, bate no meu ombro e diz
solenemente: “é assim que você escreve, senhor Remo, pensei que nesta altura já
saberia que o que mancha o papel fica, e daqui a algumas décadas ninguém vai
saber o que queria dizer".
O
pior de tudo é que ele não deixou nenhum roteiro, algo parecido com as três
leis da robótica, que pudessem guiar minhas mãos enquanto os dedos quicam no
teclado.
O
jeito é tentar explicar para você que vai ler isso aqui daqui há dez anos, ou
mais.
Aqui
do passado o que conto ocorreu enquanto ainda havia coisas como: telefone, 3G,
área de cobertura de operadoras de celular, telemarketing, entre outras coisas
que tornavam a comunicação truncada, cheia de chiados; ou melhor: algo próximo ao impossível.
Nesse
contexto recebo uma ligação o celular vibra em rubro: CHAMADA DE SPAM. Mesmo
assim resolvo atender. Ouço do outro lado algo que através da estática soou como:
“Casa das Pedras, é aí que temos que entregar o ferro?”. Respondo que não, e
que não havia comprado nada de material de construção (lembre que do
espaço-tempo em que escrevo havia uma tecnologia chamada alvenaria – o que é
difícil de explicar pra cacete, ou seja deixa para pesquisar no seu computador
quântico depois).
Três
minutos depois a ligação se repete: será o Benedito! “Estou ligando para o ddd
(pesquisa depois – eu já disse!) certo? Estou querendo entregar o ferro”. Quase
mandei posicionar o metal em um local adequado, com uso opcional de lubricantes, entretanto apenas digo que a
ligação foi repetida.
A
rotina volta ao normal e, depois de alguns outros pequenos contratempos entro, com
minha esposa, no meu carro (um veículo a combustão fóssil guiado manualmente)
recebo a terceira ligação do mesmo número: “amigo me desculpe, seu nome é Reno ou
Breno Nogueira? A letra aqui tá horrível e eu preciso entregar o ferro. Sabe
como é a caneta (pesquisa aí...) tá falhando, meu chefe disse que se eu não
entregasse o ferro de passar, já sabe né? Vou ter que pagar do meu bolso”.
A
Aninha responde: “moço pode ficar tranquilo, a tarde passo aí para pegar o
ferro”. Logo ela me explica que deixou o ferro de passar roupas (nem tente
entender), em uma loja chamada Casa das Peças, para reparos.
As
moléculas de ferro contidas nas minhas hemácias correram desesperadamente para
o meu rosto (elemento de número atômico 26 – células anucleadas responsáveis pelas
trocas gasosas) em uma reação humana comum diante de tamanha vergonha. Espero
que pelo menos isso lhe seja compreensível diante de tantas informações obsoletas.
Tem sido deste modo desde
tempos imemoriais; pois tenho certeza de que, assim como Asimov, Ilíada não vai
sair de moda tão cedo. Afinal certas coisas da natureza humana simplesmente não
mudam.