Dizem que o tal imperador estava com dor de barriga e parou na beira de um rio, sabe o posto onde tiram dúvidas? Pois é. Desde então essa data virou feriado por aqui.
Hoje, fazendo parte da Associação de Vagabundos Aposentados
faz pouca diferença para mim, é apenas dia de tirar mato no jardim. Como está
chovendo consegui tirar um grandão com raiz e tudo. Lembro bem que molequinho a
gente usava dois desses para brincar de pique, num tipo que times adversários
tentavam pegar uma espécie de troféu do outro. Gostava muito dessa brincadeira,
problema é que quase sempre terminava em briga.
Agora o texto dá um salto quântico. O ano era 1987, eu havia
acabado de passar pelo trauma de ser aluno do primeiro ano de uma academia
militar. Quem resume bem essa experiencia é Paulo Freire, em uma fala que vai
fazer algumas pessoas que nunca o leram de verdade o odiar, ela diz que: “se a
educação não é libertadora o sonho do oprimido é virar opressor”. Eu tinha
visto isso ao vivo e a cores. É difícil não odiar a quem agiu assim por um ano,
pior ainda é lidar com aqueles que reproduziram esse comportamento a carreira
toda. São leões ao lidar com subordinados e gazelas ao olhar para cima.
Havia ainda um ritual de passagem para ser vencido: passar
fome e frio perdido no mato, o que pode fazer parte de outra conversa, mas
posso adiantar que não foi tão ruim. Antes veio outro ritual inesperado, ter
1,86m foi o motivo: fui selecionado para ser guarda bandeira. Desde então a tal
da ordem unida deixou de ser tão chata e cansativa, além de um injustificado
motivo de orgulho, logo eu que sempre dava um jeito de estragar as formaturas
deixando cair o estranho chapéu de sodado de chumbo ou terminado a marcha descalço
sem saber como tinha perdido o sapato no caminho.
Como aprendi os movimentos segui essa sina por uns 10 anos. Na
época eu não sabia o quanto era bonito (e magro). O sentimento que me invadia
era uma estranha noção que mesmo sendo uma gota estaria por um breve momento representando
um oceano.
Mais tarde duras lições me fizeram entender que ela não representa matas e riquezas de um povo e sim as cores de casas reais
que o explorou impiedosamente. Momentos ainda piores roubaram o estandarte que
tão orgulhosamente carreguei meu ombro.
Mesmo assim volto a cuidar de meu quintal. Hei de correr
como quando era mais forte e veloz que qualquer mocinho de caubói. Um cantinho
dessa terra ainda me pertence e vou cuidar dele com muita atenção. Faço um gesto
incompreensível para quem passa na rua. Grito UUHHHAA e levanto um tufo de
mato, do mesmo jeito que fazia o moleque magricelo na beira da favela quando
brincava de pique bandeira.
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