domingo, 7 de setembro de 2025

Lábaro estrelado

 Dizem que o tal imperador estava com dor de barriga e parou na beira de um rio, sabe o posto onde tiram dúvidas? Pois é. Desde então essa data virou feriado por aqui.

Hoje, fazendo parte da Associação de Vagabundos Aposentados faz pouca diferença para mim, é apenas dia de tirar mato no jardim. Como está chovendo consegui tirar um grandão com raiz e tudo. Lembro bem que molequinho a gente usava dois desses para brincar de pique, num tipo que times adversários tentavam pegar uma espécie de troféu do outro. Gostava muito dessa brincadeira, problema é que quase sempre terminava em briga.

Agora o texto dá um salto quântico. O ano era 1987, eu havia acabado de passar pelo trauma de ser aluno do primeiro ano de uma academia militar. Quem resume bem essa experiencia é Paulo Freire, em uma fala que vai fazer algumas pessoas que nunca o leram de verdade o odiar, ela diz que: “se a educação não é libertadora o sonho do oprimido é virar opressor”. Eu tinha visto isso ao vivo e a cores. É difícil não odiar a quem agiu assim por um ano, pior ainda é lidar com aqueles que reproduziram esse comportamento a carreira toda. São leões ao lidar com subordinados e gazelas ao olhar para cima.

Havia ainda um ritual de passagem para ser vencido: passar fome e frio perdido no mato, o que pode fazer parte de outra conversa, mas posso adiantar que não foi tão ruim. Antes veio outro ritual inesperado, ter 1,86m foi o motivo: fui selecionado para ser guarda bandeira. Desde então a tal da ordem unida deixou de ser tão chata e cansativa, além de um injustificado motivo de orgulho, logo eu que sempre dava um jeito de estragar as formaturas deixando cair o estranho chapéu de sodado de chumbo ou terminado a marcha descalço sem saber como tinha perdido o sapato no caminho.

Como aprendi os movimentos segui essa sina por uns 10 anos. Na época eu não sabia o quanto era bonito (e magro). O sentimento que me invadia era uma estranha noção que mesmo sendo uma gota estaria por um breve momento representando um oceano.

Mais tarde duras lições me fizeram entender que ela não representa matas e riquezas de um povo e sim as cores de casas reais que o explorou impiedosamente. Momentos ainda piores roubaram o estandarte que tão orgulhosamente carreguei meu ombro.

Mesmo assim volto a cuidar de meu quintal. Hei de correr como quando era mais forte e veloz que qualquer mocinho de caubói. Um cantinho dessa terra ainda me pertence e vou cuidar dele com muita atenção. Faço um gesto incompreensível para quem passa na rua. Grito UUHHHAA e levanto um tufo de mato, do mesmo jeito que fazia o moleque magricelo na beira da favela quando brincava de pique bandeira.

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