CONTAGEM REGRESSIVA
Estou na espera.
Quando isto acontece, dois fatos me ocorrem. Um deles
é a lembrança da leitura da Ilha de Huxley, onde uma ave insistente
gritava a todo instante: “Atenção”, e “Aqui e agora rapazes”. Estas aves foram
treinadas por alguém que queria lembrar as pessoas de que não é saudável viver
em compasso de espera ou somente relembrando das glórias passadas.
A tentativa de transformar a espera em algo útil é o
que me trouxe para o segundo tema – que é aquele que pretendo discutir neste
texto – a minha obsessão por números.
Como sou muito ansioso decidi contar os dias a partir
de quadrados perfeitos, assim minha espera pelo próximo número vai decaindo a
cada vez que a contagem recomeça. O que me dá a falsa impressão de que o tempo
está passando mais depressa.
Assim ao invés de contar, por exemplo, 169 dias
mentalizo o número 13, que convenhamos parece minorar a espera, é algo assim
meio doido como alguém que tenha nascido em 29 de fevereiro dizer com a maior
cara de pau que só tem onze anos a despeito dos traços balzaquianos.
Comecei a contar a partir do quadrado de 12, o que fez
com que os quatro meses e lá vai fumaça, me parecessem, de fato distantes.
Então decidi esperar tão somente pelos 23 dias seguintes (bem se você quer
saber a diferença entre dois quadrados perfeitos basta somar as raízes –
12+11=23, que é mais fácil que 144-121=23 que seria o cálculo a ser feito) que
levariam ao quadrado de onze, mas com isto teria que esperar mais que três
semanas, uma eternidade! Apelei, no fim das contas para o quadrado de onze e
meio.
A outra opção seria extrair a raiz quadrada do número que eu tivesse em
mãos. Bem calcular o quadrado é mole, mas extrair raízes
nunca foi o meu forte.
Digamos que nos idos de 1977 fiquei traumatizado por
não conseguir aprender o algoritmo para extrair raízes. Como o ensino disto
ficou no quarto bimestre e como desde a minha reprovação na primeira série
passei a estudar firme nos três primeiros bimestres para nunca mais ficar
pendurado ou levar bomba, consegui concluir a 5a série sem saber
extrair raízes.
Cheguei a conclusão de que deveria encontrar um modo
de fazer a conta no braço, já que os alunos não dispõem, no vestibular
pelo menos, do auxílio do que qualquer máquina. Além do mais, admito que só
ligo o computador para usar o editor de texto (o que com certeza estou fazendo
agora). Sem contar com o fato de que tenho lecionado justo matemática, e não
dominar uma operação que deveria ser tão básica, não constitui qualquer mérito.
Decidi, então,
utilizar o produto notável da soma dos quadrados para obter um resultado
satisfatório ao calcular o quadrado de onze e meio.
O primeiro passo é quase como um mantra: “o
quadrado do primeiro mais duas vezes o primeiro pelo segundo e...” opa! –
para por aí! O quadrado do segundo pode ser desprezado para um resultado
aproximado, pois quando um número é pequeno o seu quadrado é ridículo,
além do mais estamos falando de dias e, portanto um número inteiro.
Então onze e meio é aproximadamente 121 + 2X11X0,5 o
que dá pra sair de cabeça sem muito esforço, até porque multiplicar 2 por 1/2
tem 1 por resultado (o que não é de espantar pois meio é o inverso de dois),
fazendo com que a expressão resulte em 121 + 11 o que perfaz 132. Além do mais
nada me impediria de aí somar os 0,25 desprezados no começo da conversa, o que
definitivamente não vem ao caso.
Perceba aí que eu tinha acabado de esbarrar em um
processo interessante, o que me levou de volta a quinta série e o motivo de não
ter entendido o maldito algoritmo: quem o inventou nada mais estava fazendo do
que completar quadrados até chegar a um resultado exato, ou aproximado conforme
o caso.
Desde jovem sempre precisei entender os processos que
envolviam os cálculos que eu aprendia, pois me disseram – e infelizmente
acreditei, em vários professores que insistiam no fato! – que minha memória não
valia grande coisa.
Ou seja, o instrumento que eu precisava para entender
o algoritmo que tentei, em vão aprender só seria visto na sétima série.
Devo dizer, deste modo que minha visão de mundo na
época, me levou a um inevitável fracasso. E meu posicionamento ético já me
impedia de fazer parte do grupo cujo lema era: “quem não cola não sai da escola”. E me desculpem os que
discordam, mas sempre achei que a cola é o recursos dos derrotados, aqueles que
sabem que vão perder o jogo então criam meios para uma falsa vitória.
Concluo esta história lembrando que uma vez participei
de um conselho de classe que queria reprovar um aluno que tinha caído de
rendimento no quarto bimestre. Lutei por ele e fui bem sucedido. Com certeza
tinha que pagar a dívida com o professor que evitou que eu estivesse cursando a
quinta série pela 28a vez.