segunda-feira, 30 de julho de 2012


 DOUBTS AND DEBTS


Where should I be?
What would I do?
Bring back to me,
The old way you woo.

What does it mean?
Would you like to go?
In this world so mean
Really I don’t know.

For sure I owe you
All the love I see,
'Cause you are to me
Everything I do.

When the time is right
Who would tell me so?
Your star so bright
May steal my soul!

domingo, 29 de julho de 2012


CONTAGEM REGRESSIVA

Estou na espera.
Quando isto acontece, dois fatos me ocorrem. Um deles é a lembrança da leitura da Ilha de Huxley, onde uma ave insistente gritava a todo instante: “Atenção”, e “Aqui e agora rapazes”. Estas aves foram treinadas por alguém que queria lembrar as pessoas de que não é saudável viver em compasso de espera ou somente relembrando das glórias passadas.
A tentativa de transformar a espera em algo útil é o que me trouxe para o segundo tema – que é aquele que pretendo discutir neste texto – a minha obsessão por números.
Como sou muito ansioso decidi contar os dias a partir de quadrados perfeitos, assim minha espera pelo próximo número vai decaindo a cada vez que a contagem recomeça. O que me dá a falsa impressão de que o tempo está passando mais depressa.
Assim ao invés de contar, por exemplo, 169 dias mentalizo o número 13, que convenhamos parece minorar a espera, é algo assim meio doido como alguém que tenha nascido em 29 de fevereiro dizer com a maior cara de pau que só tem onze anos a despeito dos traços balzaquianos.
Comecei a contar a partir do quadrado de 12, o que fez com que os quatro meses e lá vai fumaça, me parecessem, de fato distantes. Então decidi esperar tão somente pelos 23 dias seguintes (bem se você quer saber a diferença entre dois quadrados perfeitos basta somar as raízes – 12+11=23, que é mais fácil que 144-121=23 que seria o cálculo a ser feito) que levariam ao quadrado de onze, mas com isto teria que esperar mais que três semanas, uma eternidade! Apelei, no fim das contas para o quadrado de onze e meio. 
A outra opção seria extrair a raiz quadrada do número que eu tivesse em mãos. Bem calcular o quadrado é mole, mas extrair raízes nunca foi o meu forte.
Digamos que nos idos de 1977 fiquei traumatizado por não conseguir aprender o algoritmo para extrair raízes. Como o ensino disto ficou no quarto bimestre e como desde a minha reprovação na primeira série passei a estudar firme nos três primeiros bimestres para nunca mais ficar pendurado ou levar bomba, consegui concluir a 5a série sem saber extrair raízes.
Cheguei a conclusão de que deveria encontrar um modo de fazer a conta no braço, já que os alunos não dispõem, no vestibular pelo menos, do auxílio do que qualquer máquina. Além do mais, admito que só ligo o computador para usar o editor de texto (o que com certeza estou fazendo agora). Sem contar com o fato de que tenho lecionado justo matemática, e não dominar uma operação que deveria ser tão básica, não constitui qualquer mérito.
Decidi, então, utilizar o produto notável da soma dos quadrados para obter um resultado satisfatório ao calcular o quadrado de onze e meio.
O primeiro passo é quase como um mantra: “o quadrado do primeiro mais duas vezes o primeiro pelo segundo e...” opa! – para por aí! O quadrado do segundo pode ser desprezado para um resultado aproximado, pois quando um número é pequeno o seu quadrado é ridículo, além do mais estamos falando de dias e, portanto um número inteiro.
Então onze e meio é aproximadamente 121 + 2X11X0,5 o que dá pra sair de cabeça sem muito esforço, até porque multiplicar 2 por 1/2 tem 1 por resultado (o que não é de espantar pois meio é o inverso de dois), fazendo com que a expressão resulte em 121 + 11 o que perfaz 132. Além do mais nada me impediria de aí somar os 0,25 desprezados no começo da conversa, o que definitivamente não vem ao caso.
Perceba aí que eu tinha acabado de esbarrar em um processo interessante, o que me levou de volta a quinta série e o motivo de não ter entendido o maldito algoritmo: quem o inventou nada mais estava fazendo do que completar quadrados até chegar a um resultado exato, ou aproximado conforme o caso.
Desde jovem sempre precisei entender os processos que envolviam os cálculos que eu aprendia, pois me disseram – e infelizmente acreditei, em vários professores que insistiam no fato! – que minha memória não valia grande coisa.
Ou seja, o instrumento que eu precisava para entender o algoritmo que tentei, em vão aprender só seria visto na sétima série.
Devo dizer, deste modo que minha visão de mundo na época, me levou a um inevitável fracasso. E meu posicionamento ético já me impedia de fazer parte do grupo  cujo lema era: “quem não cola não sai da escola”. E me desculpem os que discordam, mas sempre achei que a cola é o recursos dos derrotados, aqueles que sabem que vão perder o jogo então criam meios para uma falsa vitória.
Concluo esta história lembrando que uma vez participei de um conselho de classe que queria reprovar um aluno que tinha caído de rendimento no quarto bimestre. Lutei por ele e fui bem sucedido. Com certeza tinha que pagar a dívida com o professor que evitou que eu estivesse cursando a quinta série pela 28a vez.

sexta-feira, 27 de julho de 2012


COISAS PARA FAZER

Recentemente vi um filme onde uma menina de uns 20 anos acabara de descobrir que viveria uns poucos meses, então decidiu listar o que fazer no tempo em que lhe restava.
Pretendo viver mais ou menos uns outros 40 anos, o que quer dizer que também tenho pouco tempo! É claro, isso se Deus concordar com meus planos. De qualquer forma aí vai minha lista:
Dizer “eu te amo” as pessoas que amo. Tenho muita facilidade de me expressar, não devo usar essa habilidade para ser irônico ou usar meras palavras para aqueles que amo. Se tiver que fazer isto devo guardar esses subterfúgios para outras pessoas.
Honrar o fato de que até hoje não me vendi. Essa ai fica como se fosse tipo um compromisso de AA, por ser difícil me comprometer para o resto da vida. Mas penso que é um bom compromisso para o dia de hoje: Não vou vender meus valores por qualquer trocado.
Deus investiu muito em mim, tenho a obrigação de oferecer um retorno. Me incomoda pensar quantas vacas, porcos e peixes se foram para que eu estivesse aqui. Trocar toda esta energia por atos indignos não é uma opção de resposta a vida.
Viver! Viajar, dirigir, amar, jogar bola, fazer caratê, brincar com as crianças, beijar a Aninha, papear com, os amigos andar com o cachorro... A lista é interminável, e amanhã fazer tudo de novo.
Manter o preparo: estudar não é simplesmente outra atividade, descobri que é o meu estilo. Não há nada mais estúpido do que não desenvolver o potencial que temos. Não precisa ser nada acadêmico, mas preciso aprender algo novo.
Manter o preparo: Barril não é forma, pelo menos não é a forma que quero para mim.
Me espiritualizar: não precisa ser uma religião oficial, mas precisa ser uma buscava intensa e interna.
Não desperdiçar: Tá bem que nunca tive uma relação legal com o dinheiro, sou um afortunado em um país miserável. Isto não quer dizer que devo jogar tudo fora para abrandar meu sentimento de culpa. Roupa de marca e equipamento de últimimimimissima geração são dispensáveis.
Ser generoso: às vezes tudo que alguém ao lado precisa é ouvir um oi, e isto pode fazer toda a diferença.
Fazer o melhor: nem sempre é possível ganhar um jogo, mas dar ao adversário um trabalho insano é só uma questão de raça. Bem sou meio branco, meio negro e meio índio, o que faz de mim uma pessoa e meia ou um vira latas, distribuído em um 1,86 m e cem quilos, portando raça não pode faltar.
Aumentar a lista, quem sabe estudar Mandarim? Sempre devo ser um menino que quer aprender.

quinta-feira, 26 de julho de 2012


SENHORA

Assim que li a reportagem sobre a formatura das primeiras aspirantes à oficial perguntei a um amigo como seria que iríamos nos relacionar com as futuras oficialas; ele, motorista de longa data, me disse que não seria novidade nenhuma pois já estava acostumado a trabalhar com mulheres ao redor. Então lhe perguntei se ele estava falando do pessoal da área de saúde, já que temos pouquíssimas combatentes na área. E ele me disse que estava falando das viaturas e em especial da Auto Escada Mecânica, que ele costumava tratar de “senhora”.
Meu amigo não demorou a fazer entender o seu ponto de vista, por uma série de razões:
-         A escada precisa ser tratada com carinho;
-         Ela é reservada e normalmente “se casa” com alguém da prontidão;
-          O “marido” da escada a trata com um ciúme daqueles;
-         Do país que ela vem as embarcações são tratadas no feminino (e por que não viaturas);
-         Ela já foi a mais bela das viaturas de toda a corporação na década de sessenta e era tratada como uma miss, outro dia ela teria lhe dito que lera o Pequeno Príncipe para poder comentar um livro quando fosse entrevistada!;
-         Ela é uma senhora respeitada: as pessoas que não tem intimidade com ela até a tratam pelo seu sobrenome: Magirus; e
-         Ele disse ter  certeza de que ela lhe amava, pois sempre o ajudou quando mais precisava.

Somente quando vi o seu sorriso maroto, entendi que o meu velho amigo não estava pedindo por uma interação psiquiátrica. Então lhe respondi que o livro infantil que ele lera não foi o Pequeno Príncipe, mas sim Memórias de um cabo de vassouras, já que ele estava querendo personificar um objeto.
Logo após meu amigo se despediu rindo.
Por um motivo qualquer, tive que ir ao pátio e para meu espanto percebi que não podia ver a AEM 012 do mesmo jeito. E então percebi que meu amigo tinha se esquecido de um detalhe importante: A senhora dançou suavemente, como se estivesse ouvindo uma valsa abraçada à verdadeiros bailarinos: o Nélio, Brício, Emmerick, Cenízio, Blaudt, Turque e tantos outros que tiveram o privilégio de tocar gentilmente seu corpo sólido e bem cuidado.
A senhora está em muito boa forma considerando-se seus quase quarenta e cinco anos de serviços bem prestados, ela costuma ser a estrela nas visitas das crianças que fazem de tudo para expressar a admiração que tem por nossa profissão.
A sua vida lembra bem uma lenda que ouvi sobre um rapaz que amava tanto uma moça que resolveu combater um dragão, mas quando ele chegou lá percebeu que o monstro era forte demais para ser combatido. Desanimado, ele voltou para dizer que não conseguira trazer o tesouro que o dragão escondera. Mas ela, mesmo assim, se disse apaixonada e aceitou se casar mesmo sabendo que o seu amor não tinha nenhum tesouro para lhe dar. O rapaz resolveu trabalhar duro para oferecer o melhor que pudesse à esposa que tanto acreditava nele. E, já em seus últimos dias, resolveu rever o dragão para entender o desafio que deixara para trás. Ao lá chegar observou que o monstro tinha morrido de velho, então finalmente pôde trazer de volta para casa o tesouro prometido.
Da mesma forma a nossa escada vence o tempo a cada dia, sob os cuidados de tantos bombeiros que a amam, alguns deles ainda estão aprendendo a bailar com ela. Outros já ostentam a medalha de ouro no peito, aquele tesouro que obtemos quando se completam trinta anos de bons serviços. A mesma medalha a nossa querida alemã deveria ter recebido ha quinze anos.
Mas ela não se incomoda de forma alguma. Hoje de manhã, por exemplo, eu ouvi seus sussurros para o nosso novo Auto Bomba Tanque... ela roncava com o seu motor possante os segredos da profissão e abria a sirene dizendo o quanto amava estar ali no auge de sua força física e do alto de sua experiência.

Nova Friburgo, 25 de agosto de 2004.


segunda-feira, 23 de julho de 2012


SENHOR MILTON

-Três vezes nove?
-Vinte e sete.
-Quatro vezes nove?
-Trinta e seis.
O diálogo poderia parecer totalmente deslocado, meu interlocutor não era uma criança de sete anos, mas uma de setenta e quatro; o cenário não era uma sala de aula, ou mesmo a mesa já esvaziada de um jantar e sim um quarto de hospital.
Alzheimer já tinha tomado quase todo o cérebro de meu sogro, se fosse um jogo de WAR seria a hora de declarar o adversário vencedor. Mas em algum lugar daquela mente sofrida o Sr. Milton resistia. E basta ter visto Matrix para saber que corpo não vive sem mente.
Ele ainda era capaz de pedir água ou suplicar para voltar para casa. No instante anterior, por exemplo, ele estava justo repetindo “tira...tira” apontando com o olhar a agulha  de soro em seu braço esquerdo. Cantei “boemia” fazendo com que ele se distraísse repetindo as palavras que sabia: “peço...voltou...boêmio...acontece...”.
De repente, nem mesmo a musica predileta foi suficiente, me vi então numa verdadeira luta de judô para evitar que ele conseguisse se livrar da cama e dos apetrechos que o mantinham.
Foi ali que lembrei do quanto ele se orgulhava em saber a tabuada.
- E aí, Milton, quanto é dois vezes um?
- Dois
Daí em diante descobri a fórmula para entretê-lo durante o resto das duas horas que me propus cuidar dele, sob a elaborada e generosa atenção dada pelos profissionais do Hospital Nossa Senhora do Carmo.
Saí de lá pensando que iria justamente preparar a aula do dia seguinte para o pré-vestibular. Logo afastei o óbvio pensamento de o quanto o ensino de matemática era inadequado no tempo de meu sogro. E me veio a idéia do quanto nós matematizamos na vida conscientemente ou não. E pensei ainda o quanto o conhecimento da matemática nos dá uma sensação de domínio. Seja este sobre os outros, nós mesmos ou até sobre a  nossa própria capacidade de aprender ou de nos manter conscientes.
Em suma saber matemática é vital! Como era vital para seu Milton não desistir.
A luta dele já estava praticamente perdida naquele instante, no entanto as suas respostas sempre apontaram para a necessidade de manter vivo e atuante:
-Quero água!
-Minha casa!
-Quarenta e cinco.
-Cinqüenta e quatro.
-Sessenta e três.
-Setenta e dois...

sábado, 21 de julho de 2012


FIM DO PRIMEIRO TEMPO

Neste ano faço quarenta e três, mais um pouquinho serão quarenta e cinco. Pelo menos se a aritmética não mudou, juntamente com tantas outras revoluções que andam por aí.
Logo estarei perto de encerrar o primeiro tempo. Não estou prevendo qualquer intervalo, ou mesmo a fala de um técnico mostrando tudo o que errei (a lista seria enorme). A vida tem várias semelhanças com o futebol, porém estas não passam de metáforas.
Mesmo assim, não consigo deixar de pensar: “cara! o jogo ta rolando, e ainda não marquei a metade dos gols que eu esperava”.
Sei apenas que os aniversários estão ficando cada vez menos esperados, e menos divertidos. Lembro quando entre os presentes eu podia esperar por latas de talco e sabonetes dos amigos menos abastados, mesmo assim desde os oito até os dezoitos havia uma contagem regressiva atentamente marcada em algum calendário escondido.
Agora as contagens dos carnavais não são mais motivo de ansiedade, apesar de ainda não serem de apreensão. Tento justificar dizendo que sou uma pessoa melhor, mesmo que isto não atinja os aspectos físicos e biológicos.
Admito ainda que a memória também anda me deixando na mão de vez em quando. Tento espantar aquele famoso alemão que nos rouba a sanidade exercitando a mente, até mesmo entre as séries de outros exercícios (leia-se supino e companhia).
Mea culpa: não consigo melhorar muito a minha alimentação, o que sei, fará com que neste jogo eu não tenha nenhuma chance de chegar na prorrogação.
Mas algo tem me ajudado a manter, ao menos, a sanidade: tenho escrito um bocado. Se as palavras merecem publicação ou não, é outra história, de qualquer modo, até arrumei um espaço para pô-las.
A intencionalidade destas palavras, não é mover o mundo, ou achar qualquer identificação entre as pessoas que estão na mesma partida (mesmo que cada uma com um diferente cronômetro no bolso). Só que entre agora e o apito final tenho o desejo de compartilhar com você, votos de felicidades, um abraço fraterno. E a esperança de que haverá um amanhã.



sexta-feira, 20 de julho de 2012


SOBRE 0 AMOR
"...não me faças abandonar meu Rama! O mundo poderia continuar sem a luz do sol, a lavoura poderia resistir sem a água da chuva, mas eu não sobreviveria sem meu Rama!„
O Ramayama
Eu te amo.
Quantas vezes você (me perdoem a confusão nos pronomes de tratamento, porém este é - quase - o único jeito sincero de dizê-lo) disse esta frase hoje, nesta semana, neste mês, nesta vida?
Percebi que sempre damos um jeito de mostrar as pessoas o quanto não gostamos delas, seja com olhares, entonação, expressões corporais.. (ufa), ou seja: para dizer "chega pra lá!", damos os nossos pulos.
0 oposto é difícil, “eu te amo” é tão precioso que guardamos no porta jóias mais intangível: o fundo do coração. Só que isto sabemos de cor (de coração): ser cordial (com o coração) pode muitas vezes partir o coração.
Mesmo assim é preciso coragem e agir com o coração  (neste caso de leão).
Não proponho os versos indianos milenares do Ramayama, nem mesmo o amor alucinado de Florbela Spanca (“minha alma de sonhar-te anda perdida...”). Muitas vezes basta um olhar, uma gentileza, que segundo o Profeta que passeava pela Rodoviária Novo Rio dizia gera gentileza.
Poupemos de tudo um pouco, o mundo precisa disto. Mas, com o amor é diferente, ele não se desgasta com o uso o amor se multiplica. 0 amor se espalha pelo cantos pelos campos e nos toma quando estamos com a imunidade baixa, ou nos noucalteia quando encontra uma guarda baixa!
 Somos assim condenados a amar.
Machado de Assis dizia que é melhor cair das nuvens do que do terceiro andar. Não sei se concordo (com o coração), apesar de nunca ter caído de um prédio, sei que cair das nuvens também é doloroso; mas acredito que vale a pena, mesmo com dor de cotovelo e o coração (ele de novo) estilhaçado pelo chão. Se caímos de tão alto é sinal de que um dia estivemos lá.

quinta-feira, 19 de julho de 2012


NO CHÃO

Me vejo sob uma ponte envelhecida pelas rugas, ofertas de um rio que nem sempre respeita o seu leito, e quando acorda, o faz com violência.
Desta história amazônica, entretanto, não há mais que um córrego que passa onde já houve plenitude.
Morro lentamente. Não há qualquer dignidade em admitir isto, porém pouco importa já que não há qualquer mão para socorrer, e também não há qualquer testemunha do crime, mas pelo menos ninguém me verá neste estado.
O fato é que lutei tantas batalhas que abri mais frentes do que fui capaz de enfrentar. Por isso não sei de onde veio a lâmina enfiada certeira entre a coluna e a escápula.
Guerreiro derrotado, caído na lama... Do modo que vivi já seria de se esperar que isto ocorresse um dia. Pelo menos tenho o suficiente para contar: das vezes que fui excluído, dos momentos de sangue e paixão, da nobreza de uns outros que não aceitaram vender o escudo por qualquer escudo, ou a realidade por qualquer real e, no fim se fingirem vencedores.
Quem fez as regras? Não sei, mas algo se reafirma, o fato de que se houve um pré–contrato para entrar neste mundo não havia qualquer cláusula que dizia que o jogo era limpo.
Então, só resta perder, esta é a única opção decente para muitos jogos que vemos por aí.
Quem vai chorar? É irrelevante. Aceitei minha própria vileza, mas não aceito as desculpas esfarrapadas, fui filho disto, filho daquilo, mas assumi cada erro.
Disse o que tinha para dizer, mesmo sem ter sido convidado, e ainda nos momentos errados e da forma errada, pois só muito depois compreendi que minha palavra sempre foi minha espada, e aquela que pendurei na parede, fruto de uma glória passada, não é mais que um enfeite.
Só que agora nada pode ser dito, o punhal tão certeiro está encravado, não há um hausto sequer. É hora de morrer em silêncio.

ARIADNE

Vá para sempre
Esqueça que lhe guiei nos labirintos
Só, que para mim não há novelos o suficiente.
Desde que fui deixada adormecida...
E na praia tudo que vi
Foi a lona negra sumindo no horizonte.


Sei que ao vê-lo velo
À luz de velas
Sob dor tão intensa
Que nem os ventos que inflam todas as velas
Nos mares mais bravios
Poderiam silenciar
Meu profundo oceano.

quarta-feira, 18 de julho de 2012


MATADOR

Eis me aqui novamente
Com a nove milímetros na mão
A arma que é de um corpo sem mente
Uma verdadeira extensão.

Quanto valia a vida deste nojento
Duzentos? Cem? Uma média com pão?
Não importa, pois não só por sustento
Tanto me esmerei nesta profissão.

Quem não quer o demoníaco poder
De infligir ao outro tamanha aflição
Já que não há no mundo maior prazer
Do que humilhar quem te pede perdão.

Mas quando a ressaca findar, próximo ao arrebol
Por não suportar tamanha grandeza
Chumbo em sua vibrante frieza
Vai tingir de rubro meu alvo lençol.

domingo, 15 de julho de 2012


POR QUE ODIAR FÍSICA?

Não fiz a declaração de rendimentos do ano de 1983, mesmo assim acredito que a receita federal não fosse se incomodar muito com isto, pois tudo que eu tinha cabia em uma mochila e uma bolsa de plástico do Peg Pag.
Apesar de não ter um documento formal da época sei muito bem o que estava na mochila, afinal ela foi minha única companheira quando sai brigado da casa  da minha irmã, por que naquele dia tivemos um desentendimento profundo: ela achava que eu deveria ajudá-la na arrumação da casa e eu não podia deixar de jogar bola pelo Palmeirinhas. Resultado: fui morar na casa de um colega por quatro meses.
No dia seguinte à briga contabilizei o que tinha para ver se dava pra vender algo para ajudar a mãe de meu amigo, mas não pude vender o bem mais precioso: a coleção completa do curso de física do Ramalho.
Os três livros rodaram comigo para diversos lugares e me abriram a mente de um tal modo que se tornaram uma das maiores riquezas naquela época, justo quando me senti um cão sem dono. Conhecer bem aqueles livros foi um passo enorme para a faculdade e depois para a academia de bombeiros.
Então quando um professor reclama de que um certo aluno o ofende por não gostar de uma determinada matéria eu entendo perfeitamente o que ele quer dizer.
Mas, não podemos perder de vista que na maioria das vezes o motivo deste ódio é justo a relação que temos com os nossos alunos.
O que pode ser resumido da seguinte forma:
Pense em uma matéria que você odeia...
Pense muito bem...
Não me diga o nome de quem fez você odiar a matéria, e perceba que certamente era um professor!
Digo isto por que algo muito estranho acontece entre os 5 e os 15 anos de uma pessoa: os porquês são substituídos por não to nem aí; e a vontade de aprender por um ódio profundo e inimaginável justo por... Física!
Enquanto isto as pessoas vão tentando explicar o mundo com superstições, horóscopo, numerologia e testes de revistas...
Então se você é professor tá na hora de pelo menos não fazer que seu aluno morra de pavor, seja de você ou da sua matéria.
Por outro lado, se você é aluno entenda aquele doido ali na frente que é capaz de dizer que ama um assunto que você sequer é capaz de entender. Pode ser que em algum momento tudo que fosse valioso para esta pessoa coubesse em uma velha mochila do Exército Brasileiro. 

sexta-feira, 13 de julho de 2012


Quero Clarinha Amoreco
Te falar sobre o que posso escrever com o A

Atenção que vai começar
Do A ao Z vindo do mar
Uma anêmona
Um bom lugar para morar
Se você é um peixe “paiaço”.

Ou então eu vou te dizer
As quantas anda o B
De bem-te-vi
O passarinho que enxerga bem
Sentado no galhinho com seu jeito zen.

Depois vou me benzer
Com C de Cristo
Olhe bem para isto
Que digo neste ABC.

Ou ainda para superar o medo
Pego um anel estrelado
E amasso um lado
Para caber no teu dedo.

O É é do Millor e do Gonzaguinha
Que fez músicas tão bonitas
Quisera elas fossem minhas!

O que faço vem da emoção
E o F de fraternidade
Mora na mesma cidade
Em que o Francisco é o seu irmão.

Um dia grande você vai ser
Então escreverei com G
E vou falar da saudade que tinha
Da minha manhosa gatinha
Que vi passo a passo crescer

Agora não posso falar
Pois ai vem uma planta muda
Feita com um galho de arruda
Em forma de H.

O I é pequenino
Mas queria ser alto
E do lado do asfalto
Como um poste iluminar.

O J vem sem jeito
E sempre bate na janela
Com o peito
Bem na hora do jantar.

O K é pior ainda
Só reclama daquilo
Ou seja:
Faz propaganda de cerveja
Mas não escreve nem quilo.

O L é longo, mas não tem mutreta
Por isto preste atenção
Pois é a Segunda letra
De uma menina bonita que mora no meu coração.

M é de mamãe Aninha
E também de Maria
Que foi mãe minha.

N é de não
E você até acredita
Que é uma palavra bonita
Quando dita com atenção.

Quem vem no meio do sol?
É o O que faz carinha bonita
Para a menina do laço de fita
Quando canta o rouxinol.

O papai é com o P
Aquele que se derrete todo quando te vê.

E agora é o Q
Todo alinhado e fofinho
Com camisa de linho
E calça  "santropê".

O R é de remo
Que não marca toca
Pois quer virar
Motor de popa.

O S é de Saudade e sentimento
E é tudo que tenho no momento.

Com um som que encanta
Lá vem o T de titia
Que na Bahia canta
E no Rio chia.

O U é de uva
Mas de cabeça pra baixo
Vira um guarda chuva.

E agora abra os olhos para ver
Pois quem vem aí é a letra V.

O W vem depois
Como se fosse um V
Multiplicado por dois.

O X vem todo brejeiro
Quem não é o último
Pode ser o primeiro.

O Y nem sabe rimar
Por que ou é Yankee
Ou está no outro lado do mar.

Mas isto não pode acabar
O Z vem montado na zebra
A anunciar:

Cada palavra que digo
Cada letra que escrevo
Vai me abrindo o mundo
E a mim para mim mesmo
E quando a estrada termina
Começa outra
Por elas as palavras passeiam
E as idéias clareiam.



Para Clara que hoje domina as letras que tanto brigaram com ela quando escrevi este texto.


UM


A vastidão do seu olhar me tomou
Como café requentado.

Suas posições imutáveis
Sua rotina inconstante
Sua superfície profunda
E azul.
Me deixaram só um sentimento oceânico
E nada mais

Então.

Por que ainda não me livrei
Da prisão aquosa
Das paredes de sua última lágrima?

Só.

Só por um instante
Queria que este sentimento de totalidade
Me abandonasse de novo
Como você sempre faz

Deixa

Talvez um dia reaprenderei
A ser
Um.

quarta-feira, 11 de julho de 2012


CANTANDO À CAPELA

Em meu aniversário o sino da capela se confundiu com o mensageiro do vento da varanda de minha casa, caso ainda não tivesse certeza de que deveria ir à missa de inauguração da igrejinha todas as dúvidas se dissipariam naquele momento.
Sempre resisti às missas e enterros, pois as repetições que ocorrem nestes eventos me incomodam profundamente. Fico imaginando, por exemplo, se me proporia a assistir a um filme, por mais que gostasse dele, já sabendo o final. Talvez se as pessoas ao redor não se incomodassem ao me ouvir cantar junto com as personagens eu poderia me propor a rever “A noviça rebelde”, mas como isto seria doido demais (até para os meus padrões) digo: passo.
O mesmo não ocorre com cemitérios e igrejas, pois admito ser apaixonado pela arquitetura destes lugares onde os artistas vão ao extremo de sua paixão pela eternidade e os mecenas gastam os tubos na esperança de serem lembrados ou de comprar um passe pro céu.
Os cento e poucos passos que separavam o lar e o santuário rapidamente se desfizeram sob o peso destes pensamentos.
Lá já se encontrava meu filho xará do santo e três das quatro mulheres de minha vida; a filha a irmãe e minha amada; e digo três para não afrontar os céticos, pois havia sentido a presença daquela fumante...
Esta capela e a coisa mais linda que se possa imaginar, sem monumentos ou riqueza, ela é a própria expressão da rica simplicidade do sábio de Assis.
A moldura se completava ao por do irmão sol e a chegada simultânea da irmã lua.
O sacerdote, um amigo, lembrava que um bairro onde se envenenam cães definitivamente necessitava da capela do protetor dos animais. E veja que o que poderia ser dito com ironia tinha apenas doçura ou pelo menos assim entendeu meu coração aberto.
Não sei se vou conseguir reviver aquele momento de riqueza interior: o abraço da Aninha, o sorriso da Cleó, a o carinho da Clara no meu joelho ou as perguntas do Francisco.
Estava lá me religando ao todo junto dos que mais amo. Com uma pontinha de vaidade ou piedade por aqueles que não podem passar por algo tão enriquecedor.
Na última terça de cada mês haverá outro culto, não decidi se a minha alma agnóstica se sentirá tão à vontade de novo, mas não custa tentar.
Afinal a vida é cheia de repetições.

terça-feira, 10 de julho de 2012


RIMAS

“Mundo rima com profundo”
Diz a mãe atenta
Sabe ela que na poesia
O que fica é a rima rica.

“Irmão e canção”
Responde a filha
Que mexe e remexe no colorido
Das folhas do jornal ido.

Penso como as rimas
Servem para as poesias
Com o ritmo marcado das linhas
E o quanto elas estão ausentes das minhas.

“Leite e leão”
“Não e não”
“Mas, mãe... combina!”
“Só em propaganda”, ela responde
(E o sorriso esconde).

Quantas palavras em uma mente aberta
E quanto esforço gasto
Para juntá-las à cola das idéias
E só a menina tem a resposta certa.

“Tente esta: o que rima com panela?
Filha minha, uma dica... Está na cozinha.”
“Esta é fácil, sei de coração...
 O que rima com panela é fogão.”

segunda-feira, 9 de julho de 2012


Tum, tum, tum. 
Conforme o carro andava na estrada, um verdadeiro tapete, podia se ouvir.
Tum, tum, tum, tum.
 O som persistente aumentava a freqüência, conforme o carro acelerava.
Auto-estrada, pneus novos, balanceados, calibrados com nitrogênio, rodas metálicas novinhas, o som persistente não vinha do contato com o chão. O cambio entrava macio, os pedais perfeitos, a temperatura ta legal, a latinha de lixo vazia, nada fora do lugar. Mas, que droga! O que poderia ser desta vez? Não fazia sentido, esta porcaria (ih! Desculpa Possante prometi nunca mais te tratar assim... perdão, perdão e perdão). Só que é chato, afinal te trato tão bem, faço tudo para que nada dê errado.
Tum, tum, tum.
Não tem jeito, tenho que parar no posto de gasolina. A mulher vai reclamar... já sei, vou reabastecer para disfarçar.  Ok, Possante, não tem nada aqui fora, pelo menos não aparentemente, bem vou fingir que algo caiu no chão para olhar por baixo...
Nada.
Bem, foi nesse pedacinho mesmo que aquele safado do vizinho te arranhou passando a chave.  Cara! Se eu tivesse uma provinha só que foi aquele... Processava, não eu matava. Tudo bem aquele lanterneiro faz maravilhas, nem parece que foi arranhado.  Não sei o que há. Vambora. O pior de tudo é ir no Marco e ouvir a velha  gracinha: “repimboca de novo doutô?”. É lógico que ele prefere os mané que deixam serviços grandes para ele ter um tremendo lucro. Se eles ao menos soubessem o quanto a mecânica preventiva faz economizar no fim das contas.
Tum, tum.
É seja lá o que for não parou.
Tum, tum, tum.
Vamos nós mais uma vez.
- Vou parar de novo, esqueci de ir no banheiro.
-Mas, meu bem, por que você não foi no outro posto? A gente vai atrasar!
Beleza! Este posto tem elevador vou ver o que tem por baixo.
Nada.
Estrada.
Tum, tum, tum.
Bicho, vou enlouquecer!
Exercitando sua invisibilidade, Emilia sempre dá um jeito para ficar encolhida atrás do banco do motorista, ali nem a mãe a percebe, e ela está fora do alcance do espelho convexo que custou muito mais do que sua boneca de pano, sua xará.
Moedinha de um centavo na mão a bater na lataria lateral no mesmo ritmo  daquele carro horroroso. Hoje o pai finalmente ouvia.

domingo, 8 de julho de 2012


RESTLESS WAVES
 
The sea I can see 
Seems uneasy to me 
Storms and waves 
Drowning my last hopes 
And my impure faith 
At last I look to east 
And so, in peace I rest. 
 
Was it a dream? 
For I don't know what I have seen 
But I won't give up 
Or cry... anyway 
I still want to feel 
The salt of your sun brunt lips 
In mine 
And your restless waves 
In my life. 

SHAKESPEARE

Passando pela rua descalça
Vi o menino doente debruçado na janela
Para receber os amores de sua cadelinha vira-latas
Que pulava para alcançá-lo.

Nunca a cena do balcão
Foi tão bem interpretada.

QUESTÃO DE FÍSICA

Ao ver sua onipotência
E no quadro
Suas respostas prontas
Minha alma grita no vácuo
Você a ouve?

quinta-feira, 5 de julho de 2012


BIMBO

Recebi uma solicitação inusitada: uma pessoa sofreu a perda de seu cãozinho querido, chamado Bimbo, e pediu que escrevesse sobre ele.
Em tese seria complicado, pois não conheci o Bimbo, mas farei como o ator global que ora representa o Agostinho da Grande Família.
Quando desempenhou, brilhantemente, o papel  principal, em “O que é isto companheiro” um jornalista, que conhecia Gabeira, lhe perguntou como ele tinha feito o congressista tão bem, Pedro Cardoso respondeu que evitou se focar na pessoa real, e sim em como uma pessoa aquele perfil reagiria em cada situação.
Pois bem, é o que farei.
Sei que o Bimbo é era um cão adorável e leal, pois assim são os cães. Da mesma forma sei que ele não era capaz de compreender as palavras de sua dona, mas o sentimento escondido em cada uma delas.
De vez em quando ele fazia bagunça, e se escondia sob a mesa da cozinha e só saia de lá quando a dona não estava mais brava, afinal todo o cão sabe que os humanos mordem! E como.
Mas, até para isto havia solução, bastava ficar quieto no cantinho, e esperar o contato visual para fazer aquela carinha de cachorro triste. E logo o pedido de desculpas era aceito.
Bimbo conhecia um cheiro diferente de todos outros e um andar que o despertava mesmo nos últimos dias de sua doença terminal. Assim como a rosa do Pequeno Príncipe, ele sabia que estas coisas tornavam sua dona uma pessoa única no universo. Ela era alguém para ser amada I-N-C-O-N-D-I-C-I-O-N-A-L-M-E-N-T-E, pois assim amam os cães.
Não sei se há um céu para os cães, espero que se haja de fato, tenham sido eles de ficção ou de carne e osso (e outro osso), possam se encontrar em um lugar maravilhoso. Lá ele deve estar brincado com a Baleia de Graciliano Ramos, feliz sob uma sobra curtindo um lugar onde cães e pessoas se entendam finalmente.

segunda-feira, 2 de julho de 2012


TRÊS COISAS SOBRE A MINHA MÃE

Dona Maria Augusta: é assim que eu gritava para vê-la chegar à janela. Sei que qualquer mãe conhece de um modo incompreensível, dentre tantas crianças qual das suas está gritando pelo seu auxílio, ou até se é sua a criança, e ainda se o brado retumbante é por festa ou dor, mesmo que o infante use a palavra que pode designar tantas outras mulheres.
Só que sempre usei o nome de batismo dela, talvez para realçar que minha mãe era única, como todas as mães o são e sobre ela falarei somente três coisas:
- Ela fumava (muito).
- Tinha uma fé inabalável de que as coisas iam melhorar, sempre dizendo que um dia ia “tirar a sorte grande”.
- Ela fez uma promessa.
Em meu tempo de menino era comum um ritual: suas mãos marcadas pela nicotina me passavam uma nota junto com o pedido: “Remo, vá comprar um maço... e lá ia eu, em busca de mais um prego para o caixão, na volta, eu ganharia uma moeda ou duas, que logo seriam trocadas por um doce de amendoim.
Dizem que um tolo e seu dinheiro logo se separam. O que, definitivamente, é verdade para mim. Mas, no caso dela prefiro pensar que uma luz que sempre ia brilhar nas condições mais improváveis. Diz, por exemplo, a lenda que em seus piores momentos o jogo do bicho é que garantia o tutu do café da tarde.
Ela tinha tanta convicção da vitória que já falava para o Baby ir pegar o resultado do dia e passar depois na padaria. Não sei se acredito nisto Ipsis litteris, penso que grana se ganha trabalhando. Pode até ser que eu não seja o único a pensar assim.
O fato é que próximo de seus últimos dias ela me pediu duas coisas: que eu a levasse na igreja onde ela entraria descalça, para pagar a promessa a São Judas pela sua cura, e também que eu pagasse a todo mundo que ela devia assim que eu pudesse. Fiz algo que realmente não gosto: dei a minha palavra sem ter a mínima ideia de como, ou sequer se eu seria capaz de cumprir.
Cor pulmonale (não sei se é assim que se escreve), são estas as duas palavras que a roubaram precocemente de mim, e o motivo de odiar cigarros. Sei que quando avisamos aqueles que fumam, que o cigarro mata lentamente é comum ouvir como resposta que ninguém esta com pressa. Só que antes de matar ele tira toda a qualidade de vida.
Não preciso dizer que esta fase foi muito dolorosa. Para quem ainda não sabe sou o mais novo de onze filhos. E por motivos que ora não vem ao caso dei apoio a minha amiga enquanto diversas pessoas a foram deixando. Por isso quem me acusa de preconceituoso, não tem a mínima ideia do que está dizendo.
Este conjunto de fatos fez com que em seus últimos sete anos ela acompanhasse o Boletim do Comando Geral dos Bombeiros e resignada, seguia as minhas transferências como se fossem para ela mesma.
Foi assim que ela acabou lá no Carmo, distante, inconvenientemente de todos os outros filhos, fazendo uma verdadeira maratona, para atos que temos por garantidos, como levantar para tomar café.
E tanto aquele espírito grandioso sofreu naquela casquinha de corpo, que eu simplesmente, não tinha o que chorar em seu enterro.
Engraçada esta tal de morte... Às vezes ela nos dá um choque, levando um Senna, quando ainda havia tanta estrada, nas outras é só alívio.
Um dia por um motivo qualquer fui a pé para o trabalho, não sei qual era a data, mas sei que havia há pouco recusado o convite a uma missa de um mês. E neste espaço aqui, vou poupar os seus neurônios de minha estranha visão do sagrado. O fato é que decidi entrar, e de repente lembrei a promessa.
Sim mamãe, você tirou a tal da sorte grande tantas vezes na vida que você pisou nos astros distraída, e somente na Igreja de Nossa Senhora do Carmo percebi que você finalmente estava curada.
Tirei os sapatos... E chorei.            

domingo, 1 de julho de 2012



O DONO DO IOGURTE

Uma série de motivos causou uma verdadeira diáspora em minha família, cito apenas que meu irmão mais velho (um ícone – como costumo dizer), passou uns bons nove anos nos porões da ditadura. Então entre idas e vindas, morei um bocado na casa de minha irmã.
Fui um cara largado, cão vira latas, às vezes sem dono. Estava recriando minha vida em família quando o Moreno nasceu. E como era o irmão mais novo, ter aquele menino engatinhando pela casa e fazendo as graças próprias da idade, constitui uma experiência ímpar.
Como tudo na vida houve também algumas perdas. “Silêncio ele está dormindo, vejam como é lindo, sua majestade o neném” enfim deixara de ser minha música. Na mesma medida as guloseimas, contadas, teriam que deixar de fazer parte das  minhas refeições.
Cleó começou pedindo, depois implorando e por fim proibindo avançar nos biscoitos e na comida da geladeira. Algo difícil para alguém na minha posição: irmão de outros dez, sempre entendi o porquê de os cães devorarem seus pratos antes de que outro aventureiro lance mão...
Não soube como me livrar dos biscoitos de chocolate (mea culpa), só que com os iogurtes o buraco foi mais em baixo. Eles pertenciam àquele menino esperto, capaz de entender que não podia se pendurar na porta da geladeira devido ao momento de força que sua acrobacia infantil causava.
Havia terminado de ler Machado se vangloriando de não ter tido filhos quando tomei a atitude diametralmente oposta: resolvi acreditar que entre diversas experiências ter uma criança em casa era uma das melhores coisas que poderia me acontecer. Contudo admito que isto influenciou decisivamente em minha dieta: não consigo mais comer iogurtes.

Remo Noronha
PREZADA MARIANA 

Como esta é a primeira vez que lhe escrevo deixe-me apresentar como um amigo de seu pai, por sinal quero lhe parabenizar por tê-lo e também por este ser o seu primeiro dia neste vasto mundo.

Sim! Ontem à noite seu pai me ligou quase enlouquecido pela emoção me dizendo que você estava vindo hoje de manhã.

Então, minha querida amiga, o que posso lhe dizer? Que este é um mundo difícil e maravilhoso? Que você vai atravessar dias difíceis, mas que sempre vai poder contar com os seus pais que são pessoas belíssimas? Que este mundo é uma escola e que podemos, muitas vezes, perder um jogo, mas que não podemos perder a lição? Que você é uma menina muito amada e que o amor é a coisa mais preciosa que existe? Bem, tudo isto você vai aprender e não sei se lhe dizer isto logo no seu primeiro dia possa mudar alguma coisa, mas esteja certa: O que temos dentro de nós precisa sempre ser expresso e isto sempre vai ocorrer de um jeito ou de outro. E você veio ao mundo para dizer algo muito especial, então assim que você souber o que é, ouça o meu conselho: GRITE.

O mundo precisa de novas vozes como a sua, mas também ouça, ouça e aprenda com as metáforas e seus vários significados. Bem sei que os conselhos dos que já estavam aqui nem sempre trazem toda ajuda que poderiam, mas de qualquer forma, aceite os meus: Olhe, para os dois lados antes de atravessar e se tiver alguém ao lado dê a mão: toda a travessia é mais fácil, quando damos as mãos.

Aprenda o máximo de tudo, ame o mundo e melhore a sua cidade...

Sobre Nova Friburgo posso lhe dizer apenas que ela é bela no verão, quando as flores roxas se espalham em cada esquina e que aí fiz muitos amigos e também que aí tive minha maior revelação:

Estava subindo a serra em um dia chuvoso e escorregadio enquanto as mágoas lavavam meu rosto. Mas lá no alto do monte um arco-íris tocava o céu e beijava a terra em cada uma das faces – É isto!, pensei – ciência e religião concordando que haverá outro dia. Deus não desistiu de nós!

Desde então vejo um arco de sete cores sobre cada bebê.

Hoje esta tiara é toda sua.