domingo, 1 de julho de 2012



O DONO DO IOGURTE

Uma série de motivos causou uma verdadeira diáspora em minha família, cito apenas que meu irmão mais velho (um ícone – como costumo dizer), passou uns bons nove anos nos porões da ditadura. Então entre idas e vindas, morei um bocado na casa de minha irmã.
Fui um cara largado, cão vira latas, às vezes sem dono. Estava recriando minha vida em família quando o Moreno nasceu. E como era o irmão mais novo, ter aquele menino engatinhando pela casa e fazendo as graças próprias da idade, constitui uma experiência ímpar.
Como tudo na vida houve também algumas perdas. “Silêncio ele está dormindo, vejam como é lindo, sua majestade o neném” enfim deixara de ser minha música. Na mesma medida as guloseimas, contadas, teriam que deixar de fazer parte das  minhas refeições.
Cleó começou pedindo, depois implorando e por fim proibindo avançar nos biscoitos e na comida da geladeira. Algo difícil para alguém na minha posição: irmão de outros dez, sempre entendi o porquê de os cães devorarem seus pratos antes de que outro aventureiro lance mão...
Não soube como me livrar dos biscoitos de chocolate (mea culpa), só que com os iogurtes o buraco foi mais em baixo. Eles pertenciam àquele menino esperto, capaz de entender que não podia se pendurar na porta da geladeira devido ao momento de força que sua acrobacia infantil causava.
Havia terminado de ler Machado se vangloriando de não ter tido filhos quando tomei a atitude diametralmente oposta: resolvi acreditar que entre diversas experiências ter uma criança em casa era uma das melhores coisas que poderia me acontecer. Contudo admito que isto influenciou decisivamente em minha dieta: não consigo mais comer iogurtes.

Remo Noronha

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