A PONTE
Tenho relutado um bocado em escrever nestas últimas
semanas e de um modo estranho devo admitir que não se trata de falta de idéias,
mas do excesso delas, o que quase certamente vai tornar este texto praticamente
ininteligível, devo confessar.
Dentre as idéias devo
destacar o fato de que finalmente parei na estrada entre o Carmo e Nova
Friburgo para observar as ruínas da ponte seca e realizar o antigo desejo de
parar em uma estrada me permitindo olhar longamente algo que me chamasse
atenção de um modo único.
Tudo bem... Vou descansar as armas e admitir que já
parei no alto do Soberbo para ver o Dedo de Deus um pouquinho mais, mas isto
não vale, todo mundo que conheço e que passou pelo menos duas vezes pela BR –
116 já fez isto.
Quero dizer com isto que certos Landmarks (desculpe-me
se não achei a palavra adequada em português por pura preguiça – mas o
contexto... se é que há algum, vai definir a palavra de um modo adequado, e
você meu amigo vai desistir de procurar um dicionário antes mesmo de tentar me
internar em um manicômio) sempre me chamaram atenção por algum motivo insólito.
Só para citar um exemplo uma colina existente na mesma estrada que motivou este
texto, que é vista no Alto dos Micheis, lembra uma baleia se vista de um ângulo
e um elefante se visto de outro. O formato da pedra, portanto, me tomou algumas
horas com o pensamento de qual nome ela mereceria, em especial para um índio
que nunca tivesse visto qualquer dos dois gigantes mamíferos.
Bem, nesta altura do campeonato você deve estar
querendo me matar caso eu não explique o que é uma ponte seca, e correndo o
risco de ser brutalmente esquartejado ainda vou me fazer de desentendido
falando que não podemos confundi-la com Sérgio Porto apesar de ser uma ponte
preta.
Desculpe-me mais uma vez, a piada infame foi
irresistível... E, ta bem: uma ponte seca nada mais é do que uma que não passa
sobre um rio, mas sim sobre uma depressão no terreno.
Muitos amigos, dentre eles o melhor que tenho, possuem
formação ou algum conhecimento de engenharia, para estes toda esta explicação
é, de fato, desnecessária. Com eles eu pararia para discutir um tema antigo, o
hábito de chamar pontes e viadutos de obras de arte. Nunca achei que os
elevados que enfeiam os centros urbanos merecessem este nome, por mais belos
que fossem os cálculos matemáticos que permitem que eles se mantenham de pé
(que os anjos digam amém).
Mas a ponte seca de Murineli é com certeza uma obra de
arte!
Sempre foi, mesmo quando a sua intencionalidade era
utilitária, e aqui peço perdão aos outros amigos que tenho e que conhecem a
definição acadêmica de arte, arte pela arte, artes plásticas e (ufa!) outros
baratos mais.
Sei que minha visão é parcial, posto que na primeira
vez que ela me chamou a atenção eu tinha acabado de ler “As Brumas de Avalon” e
a comparação com os templos dos druidas foi inevitável, passava por ali pensando
que o ar se enchia de magia cada vez que avistava o monumento. E devo admitir,
que o primeiro espanto foi fruto da ignorância quanto ao propósito daqueles
(mais tarde vim, a saber, sete) pilares que formavam um arco, e o que faziam
ali perdidos no meio do nada. Pensava que se tratava de uma antiga
fortificação, até que um dia tive a sorte de viajar com um amigo que conhecia
as ruínas e me explicou toda a história e o nome daquilo tudo, e por fim a
piadinha com o autor de FEBEAPA.
O estranho de tudo é que o conhecimento não diminui de
forma alguma a magia das grandes obras, apenas a transforma. Tinha a certeza de
que sentira algo especial quando fizesse a escalada da colina e visse a obra de
arte por outro ângulo.
Mas quando isto aconteceria? Sempre me encarreguei de
passar com pressa naquele lugar, lembro-me, por exemplo, de uma vez que decidi
vir a pé de Friburgo ao Carmo, o que acredito poderia fazer em umas doze horas
e seria uma oportunidade impar; mas naquele dia um colega de Carmo me viu e fez
questão de me dar carona, para no caminho me falar de todos discos voadores que
já vira. Quase o convidei para parar no local indicado, bastava lhe dizer que
ali devia ser um campo de pouso, mas como não sei se ele estava falando de
discos voadores a sério e como o Hospital (psiquiátrico) Teixeira Brandão fica
na mesma estrada, resolvi não arriscar uma internação dupla. Afinal admitir a
loucura quando escrevemos é muito mais fácil do que quando vivemos.
Adiei mais uma vez o desejo de parar no caminho, o que
finalmente aconteceu ontem.
Parei e entrei na estrada de chão que leva à ponte
seca e ao chegar ao pé da construção fiquei impressionado por ver que ela era
maior do que parecia ser quando vista da estrada. Passei espremido pela cerca e
estava tão motivado que não me senti sequer cansado, a despeito do meu atual
preparo físico.
Aqui chegaria o ponto no qual eu deveria descrever o
lugar e passar a emoção que me tomou quando lá estive.
Passo.
Não acredito que alguém seja capaz disto.
Com certeza as palavras iriam tirar boa parte do
brilho que o momento teve.
Do mesmo modo me abstenho de tentar uma conclusão
retumbante do acontecido, posso apenas lhe aconselhar a jogar este texto fora e
buscar seu próprio Landmark.
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