TRÊS COISAS SOBRE A MINHA MÃE
Dona Maria Augusta: é assim que eu gritava para vê-la chegar à janela. Sei
que qualquer mãe conhece de um modo incompreensível,
dentre tantas crianças qual das suas está gritando pelo seu auxílio, ou até se
é sua a criança, e ainda se o brado retumbante é por festa ou dor, mesmo que o
infante use a palavra que pode designar tantas outras mulheres.
Só que sempre usei o nome de batismo dela, talvez para realçar que minha mãe era única, como todas as mães o são e sobre ela falarei somente três coisas:
- Ela fumava (muito).
- Tinha uma fé inabalável de que as coisas iam melhorar, sempre dizendo que
um dia ia “tirar a sorte grande”.
- Ela fez uma promessa.
Em meu tempo de menino era comum um ritual: suas mãos marcadas pela
nicotina me passavam uma nota junto com o pedido: “Remo, vá comprar um maço...
e lá ia eu, em busca de mais um prego para o caixão, na volta, eu ganharia uma
moeda ou duas, que logo seriam trocadas por um doce de amendoim.
Dizem que um tolo e seu dinheiro logo se separam. O que, definitivamente, é
verdade para mim. Mas, no caso dela prefiro pensar que uma luz que
sempre ia brilhar nas condições mais improváveis. Diz, por exemplo, a lenda que
em seus piores momentos o jogo do bicho é que garantia o tutu do café da tarde.
Ela tinha tanta convicção da
vitória que já falava para o Baby ir pegar o resultado do dia e passar depois
na padaria. Não sei se acredito nisto Ipsis litteris, penso que grana se ganha
trabalhando. Pode até ser que eu não seja o único a pensar assim.
O fato é que próximo de seus últimos dias ela me pediu duas coisas: que eu
a levasse na igreja onde ela entraria descalça, para pagar a promessa a São
Judas pela sua cura, e também que eu pagasse a todo mundo que ela devia assim
que eu pudesse. Fiz algo que realmente não gosto: dei a minha palavra sem ter a mínima ideia de como, ou sequer se eu
seria capaz de cumprir.
Cor pulmonale (não sei se é assim que se escreve), são estas as duas
palavras que a roubaram precocemente de mim, e o motivo de odiar cigarros. Sei
que quando avisamos aqueles que fumam, que o cigarro mata lentamente é comum
ouvir como resposta que ninguém esta com pressa. Só que antes de matar ele tira
toda a qualidade de vida.
Não preciso dizer que esta fase foi muito dolorosa. Para quem ainda não
sabe sou o mais novo de onze filhos. E por motivos que ora não vem ao caso dei
apoio a minha amiga enquanto diversas pessoas a
foram deixando. Por isso quem me acusa de preconceituoso, não tem a mínima ideia
do que está dizendo.
Este conjunto de fatos fez com que em seus últimos sete anos ela acompanhasse
o Boletim do Comando Geral dos Bombeiros e resignada, seguia as minhas transferências
como se fossem para ela mesma.
Foi assim que ela acabou lá no Carmo, distante, inconvenientemente de todos
os outros filhos, fazendo uma verdadeira maratona, para atos que temos por
garantidos, como levantar para tomar café.
E tanto aquele espírito grandioso sofreu naquela casquinha de corpo, que eu
simplesmente, não tinha o que chorar em seu enterro.
Engraçada esta tal de morte... Às vezes ela nos dá um choque, levando um
Senna, quando ainda havia tanta estrada, nas outras é só alívio.
Um dia por um motivo qualquer fui a pé para o trabalho, não sei qual era a
data, mas sei que havia há pouco recusado o convite a uma missa de um mês. E
neste espaço aqui, vou poupar os seus neurônios de minha estranha visão do sagrado. O fato é que decidi entrar, e
de repente lembrei a promessa.
Sim mamãe, você tirou a tal da sorte grande tantas vezes na vida que você
pisou nos astros distraída, e somente na Igreja de Nossa Senhora do Carmo
percebi que você finalmente estava curada.
Tirei os sapatos... E
chorei.
Bom dia, meu amigo. Linda mensagem, lindo são os seus sentimentos. Vc expressou o amor, a dedicação e a entrega para esta pessoa especial.
ResponderExcluirUm beijo grande dentro do seu coração.
*"Tirei os sapatos... E chorei."*E eu choro com você Remo! A docilidade de uma mãe é incomparável! Felizes os que amam suas mães, berço de suas vidas, e compreendem claramente quão importante é a sua figura, presente ou não. Nada teria sido, nada é, nada será se naquele honroso e divino dia, nossas mães, iluminadas e abençoadas por Deus, não nos tivesse dado o dom da vida. Parabéns Dona Maria Augusta pelo belo filho que criaste! Uma salva de palmas para todas as mães!
ResponderExcluirFaltam-me as palavras... o amor de um filho, é uma dádiva.
ResponderExcluirUm dia um ser de luz nasceu......
ResponderExcluirSabia que falta faz tua alegria...
Voa meu sabiá, canta meu sabiá, adeus meu sabiá, ATÉ UM DIA💖